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.ouço o barulho dos carros lá fora. não ouço. ao longe talvez. passa um. meia hora depois outro. é madrugada. aqui nesta sala vazia não vazia de móveis. não vazia de vida. vazia apenas. cheia de silêncio. tudo dorme. eu não. não eu nesta noite feita de silêncios tais que quase que te sinto aqui. tu aqui. e no entanto ninguém. não ouço passos. todos dormem. eu não. tu não. onde quer que estejas. tu não. uma mensagem há pouco. não dormes. dou comigo a povoar este silêncio feito de sons e palavras. e um comboio o primeiro da manhã que passa ao longe. lá longe onde não estou. nem tu. e gosto desta calma aparente que é a noite. a noite já quase dia sem ser dia. meia noite meio dia. madrugada. não faz sol aqui. não aqui nesta sala vazia. de sons de gentes de passos de palavras. tão cheia de sons de gentes de passos. que não durmo. sempre que choro tu existes. pergunto-me porquê. não sempre que choro que eu já choro pouco. sempre que sinto. isso. sempre que sinto apareces sem aparecer, entendes? Eu não. talvez não ou talvez entenda que o silêncio de que me apercebo nesta sala vazia de gentes e passos tem palavras e sonhos e sentires e dúvidas. tantas.
.de repente quase achei que estavas. pareceu-me. assim à porta a sorrir. não te vi. senti. te.
.logo hoje ou já hoje que cheguei a uma conclusão. mais uma dúvida. és importante para mim. e o mar a romper o areal turva-me a visão. e depois. depois a ressaca. e tu. quero. só queria. tu e o querer. apertos. de coração. de braços. abraços... e ele. importo-me. importas-me. e uma onda queda-se e finda no muro que separa o areal do cimento. e a certeza quase dúvida. a incapacidade de acreditar que nos amam. que gostam. apenas porque sim. porque sou eu e não tu ou ela ou aquel'outra. outros. incapacidade de... quando a perdi? perdeste-me ou perdeste-te.
.estás aí?
.e o silêncio nesta sala vazia não de móveis não de calor. de passos. pessoas. carros que passam lá fora e entram pela janela. e comboios que saem dos carris rumo à cidade. à cidade das rotinas do trabalho da vida que existe sem nome. para que serve um nome? para nomear. existir. sem nome não se existe? não existes? que importa um nome. o teu. o meu. sei que és. sei que sou sem precisar de miradas ao espelho que reflete ilusões. existimos ainda que por vezes sem existir. aqui neste silêncio da noite não se existe. apaga as luzes. não existes.
.um carro passa lá fora. motores em surdina calam bons dias. calam-se. ao longe. e aqui nestas quatro paredes que me cercam sei que já foste dormir. lá longe. é longe o tempo de nós. foi longe a noite que acordou sem sol e a lua para sempre ficou a iluminar este recanto feito pensamentos. todo ele pensamentos e ondas que rompem o areal e batem nos muros de cimento turvam-me a visão. e o bater do meu peito conta as horas. segundos. sem som. e quase que podia jurar que aqui estavas. à porta. a sorrir. à espera do abraço. igual ao outro. não poderia ser diferente. nós sem som. a sala vazia. um avião que segue o rumo. eu na trajectória dele. do avião. levou-te. ele e tu. e a sala vazia. de som. passos. não palavras.
.de nós.
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